quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Anna Foi Pro Mar



Anna foi pro mar. Mas, antes estava prestes a ir pro ar. Estava a um passo de entrar no avião, o marido já estava lá e percebeu quando a garota parou, fixa no pensamento, e assim se manteve por poucos minutos (que guardaram consigo a eternidade, um mundo). Parou e pensou. Quando uma lágrima caiu, virou e já não estava mais lá. O marido, absorto, foi pego pela surpresa, mas, ao mesmo tempo, feliz por vez a antiga Anna, toda paixão, toda momento, toda intensidade, de volta. Não restou mais nada que não fosse sair do avião e tentar correr para alcançá-la. Sabia que não conseguiria acompanhá-la, mas, tinha que tentar. Parou e viu a imagem da moça se apagar no horizonte.
 Seria a chance de sua vida. O sonho de qualquer princesinha. Depois do casamento (belo, sim), mudar com o recém-compartilhador-de-uma-vida para a França, fazer um Mestrado, algo fantástico. Ahh, e Paris, o cheiro de Paris, o brilho de Paris. O brilho estava nos olhos dela quando soube da aprovação da Universidade francesa. No momento não pensou duas vezes: ela iria. Ele iria também, por óbvio. Em verdade, o rapaz realmente a amava. Os dois se amavam. Mas, faltava algo. Toda aquela felicidade e um vazio no coração, faltava algo.
 De pé, olhando pro avião, sentindo o cheiro da borracha queimando no asfalto fervente, Anna percebeu o que estava faltando. Sussurrou consigo mesmo, na esperança vã de que o marido (o seu amor) conseguisse ouvir, sussurrou “me espera, já estou voltando”. Ele não ouviu. Ela correu atrás do que estava faltando. Ele correu atrás dela, mas não a alcançou.
 Apressada, o tempo estava acabando, o mundo estava acabando. O fim dos tempos, do mundo, o fim dos táxis. Não passava nenhum. Não pensou duas vezes e chegou até um casal que estava preste a sair com um carro alugado. Eram franceses. Perguntou onde estavam indo. Talvez o dedinho de Deus aqui, nesse ponto, tenha ajudado. Servia. Teria que andar um pouquinho, mas, vá lá, chegaria.
 O francês voou, quase que literalmente. Afinal, a parada que fizeram no meio do caminho acabou deixando-os um pouco atrasados. Estava lá: Setor Aeroporto. Falou, quase não-falando, tamanho a fome da pressa em comer as palavras. O porteiro a deixou entrar. Já a conhecia, e tinha a festa. A festa. O elevador. Num blues solitário sentiu um mundo passar com o subir do elevador. Um mundo se assentar. O mundo que momentos antes se repousava em sua pele, no salgado da parada que fizera. Um mundo que repousou e agora, no elevador, se fixou. A festa.
 Estavam todos ali. Era o aniversário de Heloisa. Todos ali: Wendel, Vinícius, Heitor, Maria Clara. Quando chegou estavam no momento do “parabéns”. Chegou e no canto ficou. Observando. Uma lágrima caiu. Quando a comemoração acabou, Anna foi ao centro e de lá partiu, em cada direção, a abraçar cada um. Abraçou todos. E, com um abraço bem forte em Heloisa, sussurrou: estou atrasada.
 Saiu da festa e voltou ao elevador. Por sorte, por destino, por ser, na porta do prédio havia um táxi. “Para o Aeroporto!”. O trânsito ajudou. O mundo ajudou. O tempo parou e disse “vai”. Em alguns minutos estava de volta ao lugar. Quando chegou, o marido estava ali, estava esperando-a. Parecia saber que ela voltaria. Sabia que voltaria pra ele. Não perguntou nada, simplesmente se beijaram. Um beijo profundo, verdadeiro, talvez o mais verdadeiro que já tenham dado. Depois, simplesmente disse: “o piloto passou mal e o vôo foi adiado, está pra sair agora. Vamos?”. Os dois seguiram para o hall de onde partiria o vôo. Pararam, juntos, e ficaram a olhar o avião. Anestesiados com a beleza de viver.
 Entraram no avião e, já acomodados na poltrona, só então o marido perguntou “o que foi fazer?”. Ela disse “fui ver o mar”, e o beijou. Quando estava no caso do casal francês, pediu para que parassem. À sua frente a Faculdade de Direito. Parou e ficou assim. Foi então que viu um mar passando, agitado em suas ondas. Não pensou duas vezes: entrou e se banhou nas águas. Deixou que o salgado, que poderia irritar seus olhos, se pregar à sua pele. Foi então que se deu conta de quem realmente era e continuaria, para sempre, sendo. Existindo. Vivendo. Anna foi pro mar.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Eu escrevo um texto que não me satisfaz

Preguiça. Inafastável. Preguiça de escrever sobre as coisas que vejo, que sinto, que me atrevo a dizer. Preguiça de escrever sobre tudo o que sempre escrevo. Sempre as mesmas coisas. Preguiça de escrever e de viver. Ou, talvez, preguiça de escrever e vontade de ter mais tempo para viver. É, quem sabe escrever tome nosso tempo de viver. Ou, quem sabe escrever é a forma mais divina de se alcançar a vida. Tenho de voltar a escrever...