domingo, 6 de março de 2011

Perfume



Ele se encantou por várias flores, mas, talvez por algum feitiço jogado por algum invejoso ou mal afeto, sempre que ia cheirar os perfumes destas, elas em pó se transformavam. Tinha um dom, ou um anti-dom: conseguia destruir todas as flores em que tocava, todas que conseguiu um dia possuir. Quando pensou que com a rosa seria diferente, lá estava sua mão queimando a pobre florzinha. Racionalizou para si mesmo que com a dália não foi culpa sua. “Foi culpa dela”, dizia, talvez para tentar fazer com que ele próprio acreditasse nessa inverdade. Encontrou a magnólia, quando pensou que fosse o fim de tudo, e jurou que faria de outra forma, que dessa vez daria certo. Sua grosseria, seu modo bronco, rústico e insensível, entretanto, logo decepou a flor. Foi então que percebeu que amava demais todas as flores e que poderia viver apenas admirando-as, subentendido na distância. Assim as manteria vivas. Conseguiria manter-se vivo. Decidiu: ele decidiu, desde então se afastaria de todas as flores com as quais pudesse ter contato. Esconderia qualquer charme ou qualidade que por ventura pudessem encontrar encobertos em sua carcaça grossa e mostraria a todas apenas o seu lado desprezível. Nunca mais tocaria seu nariz nas pétalas, mas sempre sentiria o perfume das flores levado pela força do vento a vivificar seu coração.



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